Outra ação aponta compra de
passagens aéreas para fins particulares e políticos, com dinheiro público
Duas ações do Ministério Público Federal no Rio Grande do Norte
(MPF/RN) apontam novas irregularidades descobertas pela Operação Pecado
Capital, que desbaratou um esquema de desvio de recursos públicos no Instituto
de Pesos e Medidas (Ipem/RN), durante a gestão de Rychardson de Macedo, entre
2007 e 2010. Uma das novas ações trata do “pedágio” cobrado pelo deputado
Gilson Moura dos cargos comissionados que ele indicava à autarquia, enquanto a
outra aponta ilegalidades na aquisição de passagens aéreas.
Ambas as ações são assinadas pelo procurador da República Rodrigo
Telles e revelam detalhes das irregularidades. Na primeira, o MPF aponta que um
primo do deputado, Iberg de Paiva Moura, foi nomeado chefe de gabinete e
coordenador operacional do Ipem, entre 2007 e 2009, e em contrapartida
entregava a maior parte do salário para Gilson Moura. Caso semelhante ao de
Jefferson Witame Gomes Júnior, nomeado coordenador jurídico, em 2007.
Como forma de compensação, o então diretor do instituto,
Rychardson de Macedo, concedia diárias indevidas aos dois. Ao todo, as
irregularidades resultaram em prejuízo de R$ 53 mil aos cofres públicos. No
caso de Iberg Moura, que além de primo também trabalhou em campanhas do
parlamentar, a nomeação na chefia veio em novembro de 2007, permanecendo até 31
de outubro de 2008, quando foi nomeado para coordenador operacional, cargo que
manteve até junho de 2009.
Iberg Moura recebia mensalmente R$ 3.250, no entanto ficava apenas
com R$ 1 mil, entregando o restante a Gilson Moura. Rychardson de Macedo
explicou em seu depoimento: “Esse Iberg (…) ficava com mil reais e devolvia os
dois mil, duzentos e cinquenta a Gilson. Que ele me lamentava várias vezes e eu
ajudava ele com diária, botava diária pra ajudar ele (...)”
Iberg Moura confirmou o pagamento do “pedágio” a seu padrinho
político, esclarecendo que custeava despesas diárias de Gilson e entregava em
mãos o restante do dinheiro. “A intenção de desvio de recursos públicos no caso
é tão evidente que o servidor, em seu depoimento, nem sequer mencionou que
chegou a ser nomeado para o cargo comissionado de coordenador operacional do
Ipem. Ele, na verdade, nunca na prática exerceu a função”, reforça a ação do
MPF.
Amizade -
Já Jefferson Witame Júnior era amigo pessoal de Rychardson de Macedo, tendo
cursado a mesma faculdade de Direito. Foi nomeado coordenador jurídico em 18 de
abril de 2007, permanecendo até 1º de dezembro daquele ano. A remuneração era
de R$ 3.250, da qual ele entregava R$ 1 mil a Rychardson como “contribuição ao
deputado Gilson Moura”.
“Jefferson fez faculdade comigo. (…) No início eu coloquei ele
como coordenador jurídico, pra ele devolver, pra ficar com R$ 1.500 e devolver
o restante do salário, que era pra complementar justamente o acerto. Assim ele
ficou”, admitiu Rychardson de Macedo.
Ordens bancárias confirmam o pagamento das diárias indevidas aos
ex-servidores. Jefferson Witame recebeu R$ 6.135 por nove supostas viagens. A
situação é tão esdrúxula que as duas últimas diárias foram concedidas quando
ele já havia sido exonerado. Ouvido pelo MPF, Jefferson disse ter feito, de
fato, uma única viajem pelo Ipem a trabalho. Iberg recebeu R$ 5.605 em diárias.
Daniel Vale Bezerra e Aécio Aluízio Fernandes, ex-coordenadores do
Ipem, confirmaram o pagamento de “pedágio” a Gilson Moura por parte de Iberg e
Jefferson Júnior. Segundo MPF, Rychardson, Iberg e Jefferson Witame Júnior não
foram processados porque, além de terem colaborado com as investigações, agiram
como instrumentos dos interesses do deputado.
Passagens – A
segunda ação trata da contratação da Helo Turismo Ltda. para fornecimento de
passagens aéreas ao Ipem. Além de Gilson Moura, são réus Rychardson de Macedo,
a empresa e sua sócia-administradora, Gerlane Morais Nicolau Gurgel. O desviou
totalizou R$ 225.843,24.
A Helo foi contratada entre 2007 e 2009 sem qualquer procedimento
de licitação ou de dispensa. Isso ocorreu por determinação de Rychardson de
Macedo, que conhecia a sócia da empresa. Somente em meados de 2009 promoveu-se
um pregão, direcionado, para “regularizar” a situação.
Em 2007 foram pagos à empresa R$ 36.893,43; em 2008 R$ 98.820,34;
e em 2009 R$ 90.129,47. As passagens emitidas tinham fins particulares e também
políticos, beneficiando pessoas que procuravam Gilson Moura em busca de auxílio
material, em troca do voto.
Os processos da contratação nunca apareceram. “Isso indica que nem
sequer existem (...). A empresa foi simplesmente contratada de forma direta,
com a realização de pagamentos em seu favor sem a existência de substrato
documental para tanto”, observa o MPF.
O pregão realizado entre junho e julho de 2009 para “regularizar”
a situação apresentou diversas irregularidades. Outra empresa ofertou proposta
melhor, no entanto a Helotur saiu vencedora após o pregoeiro negociar
diretamente. “Mesmo após negociar a redução (…) a proposta apresentada pela
Helo Turismo Ltda. ME igualou-se ao lance dado pela (outra) empresa (...). Não
havia motivo para conferir preferência à Helotur”, ressalta o Ministério
Público Federal.
Com relação às passagens adquiridas, não há praticamente
documentação. Os poucos documentos revelam que notas fiscais ou faturas não
foram atestadas. Inexistem relatórios de viagem, cartões de embarque, listas de
presença em eventos ou qualquer elemento capaz de confirmar a realização das
viagens ou que os deslocamentos se deram por razões de trabalho.
Rychardson de Macedo admitiu as irregularidades e confirmou que
foram adquiridas passagens para atender interesses pessoais e de Gilson Moura:
“(...) às vezes dei passagem pra pessoas que precisavam ir pra São Paulo, Rio,
pra fazer cirurgia, já tirei passagem pra mim viajar, já tirei pra Daniel, pra
esposa dele, pra Aécio, pra Larissa, pra eles viajarem, pra Adriano.”
Há registro de passagens emitidas em favor de “funcionários fantasmas”,
que nunca prestaram serviços ao instituto, bem como para servidores que negam
ter realizado as viagens.
As duas ações do MPF tramitam na Justiça Federal sob os números
0804421-53.2014.4.05.8400 e 0804422-38.2014.4.05.840.
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