Recursos foram apropriados a
partir de ilegalidades na locação de veículos para o Ipem/RN
O Ministério Público Federal no Rio Grande do Norte (MPF/RN)
ingressou com uma nova ação por improbidade administrativa relacionada à
Operação Pecado Capital, que investigou irregularidades ocorridas durante a
gestão de Rychardson de Macedo no Instituto de Pesos e Medidas (Ipem/RN), entre
2007 e 2010. A ação inclui entre os réus o deputado estadual Gilson Moura; o
filho da ex-governadora Wilma de Faria, Lauro Maia; e o advogado Fernando
Antônio Leal Caldas Filho.
As irregularidades apontadas pelo MPF resultaram em um desvio de
R$ 547 mil em recursos públicos e incluem fraude, direcionamento e dispensa
indevida de licitação, além de outras práticas ilegais relacionadas a um
contrato ilícito de aluguel de veículos para o Ipem/RN. Dentre as situações
apontadas, está a contratação de empresa que sequer participou de licitação,
bem como o pagamento pela locação de oito veículos que nunca foram realmente
disponibilizados ao instituto, sem contar o uso de carros alugados pela
autarquia na campanha de Gilson Moura, em 2008.
Além de Gilson, Lauro e Fernando Caldas Filho, são réus o próprio
Rychardson de Macedo, as empresas Protásio Locação e Turismo Ltda. (ProTour),
Acesso Locadora Ltda., e seus respectivos representantes: Israel José Protásio
de Lima e Francisco Marinho de Freitas Neto.
Contratos -
A ação de autoria do procurador da República Rodrigo Telles revela que, entre
2007 e 2010, a ProTour e a Acesso Locadora foram contratadas pelo Ipem/RN para
locação de veículos, por indicação de Lauro Maia e Fernando Caldas Filho. A
primeira assumiu em 2007 a partir de uma dispensa de licitação e posteriormente
de um pregão no qual houve direcionamento em seu favor.
O edital do pregão (lançado em junho de 2007) exigia uma licença
ambiental que a Protásio era uma das únicas no Rio Grande do Norte a possuir.
Tanto que 14 empresas retiraram cópia, mas apenas a ProTour compareceu. Sem
contar que a contratação por dispensa (de maio) foi justificada por “situação
emergencial”, embora a locação de veículos não se enquadre nesse conceito o
Ipem disponha de frota própria.
Para a dispensa, a proposta da ProTour foi apresentada com cópia
do contrato social e certidões negativas, reforçando que já havia sido
previamente escolhida. Quanto ao pregão, relatório de auditores do Inmetro
apontaram diversas irregularidades como falta da pesquisa de preços prévia.
Em outubro de 2007, a Protásio desistiu do contrato e “indicou” a
Acesso Locadora. Essa empresa não havia sequer participado do pregão.
Realizou-se cotação de preços e “coincidentemente” a Acesso foi contratada pelo
mesmo valor da Protásio (R$ 21.700 ao mês). A documentação não esclarece se
houve substituição indevida da ProTour, ou se ocorreu mais uma dispensa
indevida.
Em maio de 2009, o Ipem, procurando regularizar a situação da
Acesso. instaurou um pregão presencial. O procedimento mais uma vez apresentou
irregularidades, como falta de pesquisa de mercado, ausência de parecer
jurídico e de termo correto de homologação. Auditoria do Inmetro constatou a
homologação com valor de R$ 104 mil e a assinatura de um contrato de R$ 696
mil.
Negociações -
Depoimentos de envolvidos esclareceram detalhes. O esquema de locação nasceu de
negociação entre Rychardson, Fernando Caldas Filho (representando Lauro Maia) e
Israel Protásio. “Essa empresa foi logo quando a gente firmou o acordo com
Fernando e Lauro, que ia ficar meio a meio. (…) Ele trouxe a ProTour, que foi a
primeira ganhadora”, revelou o ex-diretor do Ipem.
Rychardson confessou que “Fernando já trouxe o edital pronto” e
complementou: “(…) locou à Acesso doze carros (…) e uma caminhonete (...).
Desses carros só vieram cinco. Os outros sete eram de onde vinha o retorno, e a
caminhonete”. O dinheiro desviado era recebido por Fernando Caldas Filho, mas
na campanha de Gilson Moura ficou a cargo de Rychardson, para pagar gastos do
candidato. Ex-servidor do Ipem, Aécio Fernandes confirmou ainda que “na época
(…) cerca de dez carros que deveriam ser locados ao Ipem/RN foram usados como
carros de som da campanha”.
O próprio representante da Acesso, Francisco Marinho Neto, relatou
em depoimento ao MPF: “no fim do ano de 2008 o depoente constatou que vários
dos veículos disponibilizados ao Ipem/RN foram usados na campanha de Gilson
Moura à Prefeitura de Parnamirim (…) o depoente localizou tais veículos em
Parnamirim, em péssimo estado, em um galpão; os veículos estavam danificados e
adesivados com propaganda eleitoral de Gilson Moura.”
Desvio -
Os contratos de locação de veículos eram uma das principais fontes de desvio de
verbas do Ipem, concretizada com auxílio dos representantes das empresas. A
ProTour recebeu R$ 111.788,32 do instituto, quando só teria direito a R$ 27
mil. A Acesso recebeu R$ 658.613,34, quando deveria ter ganho R$ 195.750. Os
desvios totalizaram R$ 547.651,66.
A ilegalidade foi uma das constatadas pela Operação Pecado
Capital, na gestão de Rychardson de Macedo, indicado por Gilson Moura para o
cargo. Rychardson tornou-se o operador de um esquema que favoreceu interesses
pessoais, políticos e financeiros do deputado. Praticamente tudo o que
“arrecadava” no Ipem por meio das práticas ilegais era repassado ou dividido
com seu “padrinho”.
Atuação –
As investigações do MPF apontaram que Lauro Maia e Fernando Caldas Filho
“atuaram nos bastidores político-administrativos. Lauro é advogado e exercia
influência na gestão da então governadora Wilma de Faria, sua mãe, tendo
indicado para o Ipem “funcionários fantasmas”.
Fernando Caldas Filho é parente e foi sócio de Lauro Maia entre
2006 e 2012, em um escritório de advocacia. O MPF aponta que Fernando cumpria o
papel de intermediário entre Lauro e Rychardson de Macedo. Caberia a ele levar
para o diretor do instituto os nomes dos funcionários a serem nomeados, de
acordo com a vontade e indicação do filho da governadora.
O advogado também era responsável por realizar com Rychardson o
acerto de contas dos recursos desviados. A participação dele e de Lauro Maia
foram confirmadas através das delações premiadas. O depoimento do ex-diretor do
Ipem reforçou que, além da indicação de funcionários, os dois recebiam dinheiro
desviado principalmente do superfaturamento do contrato de locação de veículos.
Rychardson de Macedo declarou que Fernando Caldas Filho foi quem o
aconselhou a alugar um número maior que o necessário de veículos. Os recursos
desviados ficavam com o advogado e com Lauro Maia, que completavam a “cota” com
parte de outros contratos superfaturados.
Os contratos resultavam em mais de R$ 30 mil mensais para os
envolvidos no esquema. “(...) dava uns trinta e pouco. Fiquei na incumbência de
todo mês fazer alguns processozinhos pra poder acrescentar o valor, pra dar uma
média de uns 20 mil pra eles e 20 mil pra mim e Gilson”, revelou o ex-diretor,
que também incluía na soma o dinheiro desviado do salário de “funcionários
fantasmas”.
Para o MPF, sem o apoio de Lauro Maia e a intermediação de
Fernando Caldas Filho, Rychardson não teria condições de montar e operar o
esquema de desvio de recursos públicos, que favoreceu também Gilson Moura.
“Lauro (…) e Fernando (…) garantiram a conivência do Governo do Estado (…) com
a verdadeira pilhagem aos cofres públicos promovida na autarquia estadual”.
As condutas apontadas na nova ação resultaram em enriquecimento
ilícito, prejuízo ao erário e violação a princípios da administração pública. A
ação tramita sob o número 0804870-11.2014.4.05.8400.
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